Pensamento do Mês:

Outubro pega tudo.

Outubro quente traz o Diabo no ventre.

Outubro secão, negaças de verão.

17 de janeiro de 2007

Sobre o aborto...

Bom dia, boa tarde ou boa noite, consoante o caso.
Chegou-me à caixa de correio este mail e decidi partilhar convosco.
Está de facto muito bom!
Boa leitura aos interessados! ;)

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Caros amigos

A questão do aborto está mais uma vez na ordem do dia. É certo que uma
parte significativa dos cidadãos não lhe dá tanta importância como à
época de saldos, aos quilos que a balança marca, aos custos dos SMS,
aos resultados da I Liga, às vitórias (ou não) do Mourinho na
Inglaterra, à Opa da Sonae sobre a PT ou às variações do Nasdaq na
Bolsa. Longe de mim desviar as atenções de quem quer que seja de
fenómenos tão vitais e estratégicos para a história da humanidade com
assuntos tão comezinhos como este. A verdade é que não posso ficar
indiferente à panóplia de argumentos que têm sido avançados (quer
pelos defensores do sim quer pelos do não) que nada dignificam a nossa
espécie, e que nos põem a olhar para um verdadeiro espelho de
indiferença e banalidade bacoca que muitos de nós se recusa
perceber... Não consigo compreender (admito que possa ser defeito meu)
que a discussão de um assunto como o aborto se reduza à utilização
sistemática (pelo menos
três-mil-quinhentas-e-trinta-e-duas-vezes-por-dia) da palavra
"obscurantistas" para caracterizar aqueles que defendem o não, como
sendo representantes do conservadorismo impeditivo do progresso da
raça, herdeiros de uma sociedade rural, ignorante, salazarenta,
pseuso-moralista, em oposição aos espíritos iluminados dos novos
Voltaire e Diderot da modernidade, intelectuais de fina estirpe
(acabados de sair das faculdades, alguns com grandes mini-saias para
animar o pessoal...), capazes de discorrer abundantemente com laivos
de inteligência estratosférica sobre os mais diversos temas do
conhecimento humano, desde o envio de tropas para o Iraque até aos
conflitos na Bielorússia, aos progressos da tecnologia no Japão, às
várias espécies de venenos para acabar com as baratas na China, aos
centímetros de costelas descarnadas das crianças do Sudão, ou aos
efeitos da praga das pulgas dos cães no aumento das colónias de
gafanhotos no Burundi. Qual o campónio do interior, velho, católico, e
naturalmente pacóvio, seria capaz de tão brilhante diarreia
intelectual?

Sejamos claros e deixemo-nos de maniqueísmos idiotas. Os defensores do
sim ao aborto são, na sua maioria, "gente boa", defensora dos direitos
humanos, da liberdade, do acesso igualitários aos cuidados de saúde, à
educação, à intervenção política e cívica, etc., etc., etc..
Curiosamente, os defensores do não também! Então, o que é que
distingue gente boa que quer o aborto de gente boa que não quer o
aborto? É o valor dado à vida, dizem alguns. Mas eu tenho amigos
(gente muito boa....) que defendem o aborto e que se dizem
intransigentes defensores da vida!... Então, em que é que ficamos?

É isto que sinceramente me aborrece... Num assunto em que a ciência já
avançou o suficiente para poder esclarecer em boa parte os cidadãos,
evita-se trazer a ciência à arena da discussão para que ela não
inquiete as consciências. É preferível vivermos na ignorância (achando
que somos todos doutores) do que sermos confrontados com verdades que
exigem tomadas de posição desconfortáveis para o nosso modernismo
intelectual condizentes com os valores que dizemos defender. Por isso,
cortando a voz à ciência, é possível entramos em discussões altamente
esclarecedoras como "Os adeptos do sim não defendem o direito à vida"
ou "Os adeptos do não querem impedir-nos de entrar na Europa
civilizada". Ou então, partindo de factos, reduzi-los a meras
opiniões: "o feto no seio materno constitui uma vida humana desde a
sua concepção" ou, em contradição, "aquilo que está na barriga das
pobres-mulheres-desgraçadas-que-têm-que-recorrer-ao-aborto-clandestino
(não convém falar de "feto" porque o termo é desconfortável...) é
apenas uma coisa, um vegetal".

Perdoe-me os que não concordam comigo (estão a ver como é bom vivermos
em democracia?), mas não consigo pensar que nas minhas primeiras dez
semanas de vida (dos nove meses que estive no seio da minha mãe) fui
uma hortaliça! Eu sei que existe ainda a hipótese da couve lombarda,
da alface ou do repolho... Mas também não acho agradável, e até me dá
uma volta ao estômago. Provavelmente nos próximos tempos terei que
fazer algumas adaptações aos meus hábitos alimentares... Mas o que eu
acho mais extraordinário é esta capacidade que nós, seres inteligentes
e brilhantes temos, de conseguirmos vislumbrar, precisamente às dez
semanas de gestação (e zero segundos), aquele que é sem dúvida o maior
milagre da humanidade: a transformação de uma hortaliça num ser
humano! Já estou a imaginar as nossas televisões em emissão especial:
a RTP providenciará uma emissão extraordinária do "Dança Comigo"; a
SIC levará todo o pessoal para a Freiria e fará um episódio
super-mega-fixe da Floribella"; a TVI colocará no ar mais um daqueles
programas lamechas em que artistas famosos vão cantar para arranjar
uma cadeira de rodas para uma menina do concelho de Macedo de
Cavaleiros que não consegue andar. Os festejos da passagem de ano vão
ser reeditados. Os mágicos e bruxos mais famosos da actualidade
(incluindo o Harry Potter e o Luís de Matos) estarão presentes e
prepararão as suas varinhas para garantir o sucesso da transformação.
Lá fora, bruxas anónimas farão uma manifestação de protesto por as não
as terem deixado colaborar. E o grande momento acontecerá. Quanto o
relógio bater as doze badaladas das dez semanas, eis que uma hortaliça
(provavelmente uma couve portuguesa) perderá as suas características
tão apreciadas de acompanhamento privilegiado das batatas com bacalhau
(e grão, adoro grão...) para se tornar, imaginem só, uma criança. Que
espectáculo hilariante. O público comentará: "Como é que eles fizeram
aquilo?" ou então "Bem..., o Luís de Matos é mesmo bom!"...

Não, meus amigos, ao contrário do que parece, não acho que devamos
brincar muito com este assunto. Já se tem brincado demais. A estupidez
dos argumentos já chegou longe demais. Sou claramente a favor da vida,
e independentemente das minhas opções políticas, religiosas e outras
que tais não posso ficar indiferente a uma cultura de ignorância em
que se pretende enfaixar a opinião pública. Muitas das coisas que se
dizem no contexto das actuais campanhas não têm importância nenhuma em
comparação com este fenómeno central que é a defesa intransigente do
direito à vida. O aborto clandestino é um drama, os abutres que
vagueiam nesses meios e que ganham muito dinheiro à custa das mulheres
com problemas são um atentado a uma sociedade que se diz democrática,
etc., etc. É verdade. Mas o aborto enquanto tal não pode ser a solução
porque põe em causa o direito mais central de toda a existência
humana, devidamente preservado na Constituição: o direito à vida.

Não gosto, sinceramente, de muitos dos argumentos que têm sido
lançados no âmbito da campanha sobre o aborto. Não gosto de trocas de
acusações minimalistas da dignidade humana, de considerações sobre
campanhas milionárias, de reflexões sobre o aumento da despesa pública
e sobre a utilização dos meus impostos para fazer abortos. Não está em
causa a verdade dos argumentos. Só que acho que não são dignos, porque
o que está em causa é a vida humana, e essa não precisa de argumentos
financeiros para ser defendida. Pelo menos, eu entendo que não devia
precisar. Mas, provavelmente, sou eu que estou errado!

Eu sei que se o sim ao aborto vencer, nos arriscamos a ver, nos
hospitais públicos, pessoas que estiveram dois anos e meio à espera de
uma operação, muitas delas vivendo dramas humanos que não se desejam a
ninguém e com níveis muito baixos de qualidade de vida, a terem que
esperar ainda mais alguns meses pela sua operação por causa do
aparecimento de mulheres grávidas que querem abortar). É certo que o
direito à igualdade colocaria essas mulheres na lista de espera do
Serviço Nacional de Saúde, o que as faria esperar dois anos e meio ou
mais pelo aborto. Mas como qualquer um de nós compreenderá, isso não
poderá funcionar assim, pelo que é bem provável que outras pessoas,
também elas boas e sofredoras, também elas dignas de figurarem nas
listas de preocupações e prioridades dos partidos políticos e demais
movimentos de cidadãos, possam vir a ser prejudicadas. "É isso, sim
senhor", dirão alguns; "é mentira e demagogia pura", dirão outros. E
no "diz-se-que-diz" lá voltamos nós ao mesmo nível de discussão!...

Não nego que estas e outras questões possam ter peso no momento do
voto. Por isso são usadas. Mas, sinceramente, para mim elas perdem
todo o seu valor a partir do momento em que alguém se atreve a
invocá-las para defender (ou, nos casos contrários, para negar como
tópico de discussão) uma coisa tão simples e fundamental como é o
direito à vida. Para mim o direito à vida defende-se por si mesmo, e
qualquer outro argumento só contribui para o diminuir.

Se o problema é perceber se o embrião nas primeiras dez semanas é já
uma criança só porque já tem os traços faciais do ser humano, só
porque já possui nariz e boca, só porque já tem todos os dedos das
mãos e dos pés perfeitamente desenvolvidos, só porque já apresenta
ambos os lábios bem definidos e os olhos com pálpebras
individualizadas (e não sou eu que digo isto, porque do assunto não
percebo nada, mas especialistas - médicos e professores - de
genética, pediatria, cardiologia, biologia, embriologia, ginecologia,
obstetrícia, neonatologia, etc...) ou se pura e simplesmente é um
repolho esquisito, então que se convoque a comunidade científica para
nos explicar A TODOS (mesmo àqueles que acham que não precisam porque
sabem de tudo, até daquela questão das pulgas dos cães do Burundi) o
que se passa efectivamente com o embrião humano nas primeiras dez
semanas. Não se evite a sua participação nos debates nem se
partidarize a questão. E se for preciso, convoque-se também as
associações de agricultores para nos ajudarem a perceber se é normal a
produção de hortaliças esquisitas com olhos, boca, nariz, dedos,
braços, pernas, etc... Mas, por favor, que os pseudo-intelectuais (no
circo têm outro nome...) que não percebem nada do assunto dêem lugar,
nos meios de comunicação social, a quem nos pode realmente informar. A
decisão será depois de cada português que for às urnas. Só assim ele o
poderá fazer em consciência. O resto... são tretas!

Perdoem-me se, por amizade, se sentiram obrigados a ler este texto até
ao fim e se não gostaram. A verdade é que também não o fiz para que
gostassem. Fi-lo porque... enfim, porque me apeteceu. E o direito à
reflexão e a não ter que explicar porque é que decidi fazê-lo ainda é,
pelo menos por enquanto, algo de que posso usufruir.

Um abraço a todos,
Eduardo Frutuoso


E AGORA, EXPRIMAM-SE! :p

3 comentários:

Anónimo disse...

Acho melhor nem comentar qualquer tipo de opinião...
Mas já agora fiquem sabendo q vai haver um debate sobre o mesmo assunto no ISLA a data será anunciada em breve mas descobram mais promenores no forum da AAISLA o link:
http://www.forum.aaisla.com/index.php?topic=18.msg6

Anónimo disse...

Só dizer q trazer à baila q o feto até às 10 semanas é um ser vivo parece-me um pouco "bater no ceguinho" - os maiores especialistas já explicaram isso milhentas vezes.
N sou nem tenho q ser, a favor ou contra o acto do aborto eu si, sou apenas a favor da liberdade de escolher.
Estudos apontam para q um filho n desejado tenha uma enorme probabilidade de vir a ter problemas sociais do foro familiar. Isso preocupa-me.
Dizer q pessoas vão ficar à espera de operação por causa disso é da mais pura demagogia. Até pq mt provavelmente a maioria deles serão feitos em clinicas particulares. Essas clinicas nunca deram um passo pra ajudar o Estado a combater as listas de espera mm qd têm disponibilidade de salas.

Anónimo disse...

pois... depois é preferível ouvir-mos notícias de pais que deixaram os seus bebés morrer à fome ou à paulada...